FUNDOS SOBERANOS




CONCEITO E CARACTERIZAÇÃO

Os Fundos Soberanos (FS) ou Sovereign Wealth Funds (SWF), são Organismos de Investimento Colectivo (OIC) especiais ou de escopo e são detidos por um determinado Estado. Estes são desenvolvidos para cumprirem desígnios macro-económicos e administram um volume significativo de activos com o propósito de atingirem objectivos financeiros, recorrendo a estratégias de investimento que incluem investir em activos no mercado internacional. Em regra, estes são desenvolvidos de modo a não constarem do balancete de superavits fiscais, receitas advindas de privatizações, de operações oficiais em moeda estrangeira e de pagamentos de excedentes.
Esta definição exclui, inter alia: reservas de divisas detidas por autoridades monetárias; operações de empresas públicas (no sentido tradicional); fundos de pensões de funcionários públicos e outros activos que sejam administrados em benefício de indivíduos.
Alguns fundos soberanos podem ser controlados por um banco central, que concentra os fundos no decurso da administração do sistema bancário. Este tipo de fundo assume, geralmente, grande relevância económica e fiscal. Outros, são simplesmente as poupanças estatais que são investidas por várias entidades para fins de retorno do investimento e que podem não ter um papel significativo na gestão fiscal (nestes casos, constitui-se, em regra, uma entidade independente).

E cabe ao Governo do Estado onde o SWF tenha sido implementado, definir as regras relativas: a concentração ou acumulação de activos (limites máximos e mínimos de investimento e poupanças); o montante que pode ser retirado do Fundo e em que circunstâncias pode ser retirado; e em que classe de activos, sejam domésticos ou externos, o Fundo poderá investir.
Os fundos concentrados podem originar (de) ou representar depósitos em moeda estrangeira, ouro, Direitos Especiais de Saque (os Special Drawing Rights/SDRs), isto, juntamente com outros activos nacionais como fundos petrolíferos ou outras participações industriais e financeiras. Esses são activos das nações soberanas que normalmente são mantidos em moedas de reserva domésticas e diferentes (como o dólar ou o euro).

Estas entidades podem ser estabelecidas como empresas de investimento, fundos de pensões estatais, entre outros.

Importa, ainda, distinguir entre fundos detidos por entidades soberanas e reservas em moeda estrangeira detidas por bancos centrais, onde se compreende que: os fundos soberanos são caracterizados como instrumentos que procuram maximizar o retorno a longo prazo; já as reservas cambiais operam como "estabilizadores cambiais" de curto prazo e como instrumentos de gestão da liquidez.

 No entanto, estes instrumentos (os SWF), desenhados para maximizarem a riqueza pública e, assim, assegurarem, de alguma maneira, o futuro financeiro dos cidadãos como um todo, também levantam alguns questionamentos.

Com a expansão da "pool" de activos de um SWF, quer em dimensão, quer em importância, o seu potencial impacto sobre uma determinada classe de activos ou mercado também aumenta, o que leva a que alguns países receiem que investimentos feitos por SWFs possam levantar riscos para a segurança nacional, pois, coloca-se a possibilidade de que certos investimentos visem conseguir o controlo de determinada indústria estrategicamente relevante, não com objectivos financeiros, mas sim políticos. Isto tem originado debates, em algumas realidades, sobre a necessidade de se desenvolver ou aplicar instrumentos destinados a limitar ou mesmo impossibilitar investimentos por parte de SWFs em países terceiros. Porém, enquanto alguns procuram apartar tal possibilidade por receio de isto resultar em políticas proteccionistas (em demasia), outros procuram concretizar tais instrumentos.

Para além disso, a falta de transparência de muitos Fundos Soberanos (mesmo com a elaboração dos Princípios de Santiago, que servem de preceitos orientadores da actividade dos SWFs, muitos continuam a apresentar questões de transparência) revela ser uma preocupação (legítima) de muitos investidores e reguladores, nomeadamente, a falta ou inadequada transparência relativamente a dimensão real do Fundo, objectivos e estratégias de investimento, governo societário/corporate governance (em particular, os mecanismos instalados para a resolução de conflitos de interesses) e participações que detenham em fundos de private equity.

Note-se, também, que apesar de terem uma importante função do ponto de vista macro-económico, os SWfs, em regra, não intervêm directamente nas políticas macro-económicas, excepto quando:

i) Seja necessário realizar transferências para o Orçamento Geral do Estado, de modo a suprir necessidades específicas e resultantes de situações excepcionais;

ii) Quando se verifique a necessidade deste ceder fundos ao Banco Central para que este possa suprir deficiências da balança de pagamentos ou satisfazer políticas monetárias, isto, sempre em situações excepcionais;

iii) Seja necessário estabilizar certos sectores ou empresas que sejam vitais para a economia nacional (isto quando outros mecanismos se provem insuficientes ou ineficazes).



PRINCÍPIOS DE SANTIAGO

Como já foi referido, este tipo de organismo levantou (e continua a levantar, embora, agora com menor intensidade) questões concernentes à sua falta de transparência (em diversas dimensões) o que levou a que de 2 a 3 de Setembro de 2008, no Chile, alguns dos principais Fundos Soberanos do mundo se reunissem com o intuito de formarem um Grupo de Trabalho de Fundos Soberanos temporário, de onde emergiram os 24 Princípios de Santiago. Estes consistem num conjunto de padrões internacionais relativos a transparência, independência e responsabilização dos SWFs, na prossecução dos objectivos para os quais foram concebidos.
Estes Princípios foram publicados depois de apresentados ao Comité Monetário Internacional do FMI, a 11 de Outubro de 2008. Daqui também resultou a criação do International Forum of Sovereign Wealth Funds (IFSWF), o Fórum Internacional de Fundos Soberanos (FIFS), ao qual compete supervisionar o cumprimento destes Princípios e representar os Fundos Soberanos em debates sobre políticas internacionais.

Desenvolvidos, então, para garantirem e demonstrarem que as decisões de investimento tomadas por Fundos Soberanos têm fundamentação e propósito económico e financeiro (procurando afastar, assim, os receios dos países terceiros ou de destino do investimento de que este seja politicamente motivado), estes Princípios e Práticas Comuns/PPC (Generally Accepted Principles and Practices/GAPP) têm como objectivos orientadores:

i) Contribuir para a estabilidade do sistema financeiro global e da livre circulação de capital e de investimentos;

ii) Adequar os SWFs à estrutura regulatória e aos requisitos de transparência dos países onde investem;

iii) Realizar investimentos observando a relação risco-retorno (económico e financeiro);

iv) Desenvolver e implementar uma estrutura de corporate governance que contemple controlos operacionais, mecanismos de gestão de risco e responsabilização por parte da entidade e da sua administração.


O propósito dos PPC/GAPP é, então, providenciar uma estrutura de governo societário, que seja ampla e aceitável para todos os SWF e também pelos reguladores e investidores, bem como a de estabelecer práticas comuns de investimento (entenda-se aqui, a conduta que os SWFs devem adoptar quando estabelecem estratégias de investimento), procurando dotar os SWFs de maior transparência, rigorosidade e solidez.
Todavia, tratam-se de princípios que os SWFs adoptam voluntariamente para que exista um padrão de conduta comum a todos, cabendo aos países de origem ou mesmo aos países destinatários de investimento, transporem estes princípios para os seus ordenamentos para assim lhes conferirem força legal, o que também contribui para uma aproximação entre as diferentes estruturas regulatórias nacionais (note-se que algumas estruturas regulatórias já correspondem, em maior ou menor grau, com os PPC/GAAP, mesmo sem se proceder à sua transposição).

Ainda, estruturalmente, os PPC/GAAP, desdobram-se da seguinte maneira:

i) Procuram sintonizar-se ou coordenar com o ordenamento jurídico e com os objectivos das políticas macro-económicas;

ii) Procuram providenciar uma estrutura institucional e de governo societário;

iii) Procuram providenciar uma estrutura sobre as políticas de investimento e mecanismos de gestão de risco.


Essencialmente, os PPC/GAAP procuram providenciar uma estrutura institucional e de governo societário que seja robusta e que facilite a formulação de estratégias de investimento consistentes com os objectivos definidos para o SWF em concreto. Isto exige, então, que se implemente uma estrutura de governo societário que separe o proprietário do corpo governativo e da gestão, possibilita uma independência operacional na gestão do SWF, garantindo que as suas decisões de investimento não se sujeitam à vontades ou interesses políticos. Uma política de investimento clara demonstra que o SWF está comprometido com um plano e práticas de investimento disciplinadas e a implementação de mecanismos de gestão de risco que sejam funcionais (e transparentes) promovem uma melhor ou maior responsabilização relativamente aos investimentos realizados.
Recorde-se, também, que a transparência é e deve ser um aspecto importante não apenas para os reguladores e para os investidores, mas também para os cidadãos do país de origem do Fundo Soberano, pois, são estes os seus proprietários e beneficiários últimos, representados pelo Estado.

Importa agora enumerar estes princípios, para que se possa compreender melhor o acima exposto:

1) O regime jurídico do Fundo Soberano deverá permitir que este concretize o seu objectivo de forma eficaz;

  1.1) O regime jurídico deverá assegurar solidez legal ao Fundo Soberano e às suas transacções/investimentos;

  1.2) A estrutura legal do Fundo Soberano e as suas relações com órgãos públicos devem ser de conhecimento público;

2) A política do Fundo Soberano deve ser clara e publicamente conhecida;

3) As actividades do Fundo Soberano que tenham um impacto directo significativo em questões macro-económicas domésticas, deverão ser coordenadas com as autoridades monetária e fiscal para que exista coerência com as políticas macro-económicas;

4) Deverão ser divulgadas as políticas, regras, procedimentos ou acordos referentes as operações de financiamento, de levantamento/desinvestimento e de gastos do Fundo Soberano;
  4.1) A origem dos fundos do Fundo Soberano deve ser divulgada;

  4.2) A abordagem quanto ao levantamento/retirada (de fundos) e aos gastos feitos em nome do Governo deve ser divulgada;

5) Os dados estatísticos relevantes referentes ao Fundo Soberano devem ser reportados ao proprietário (Estado) em tempo hábil ou conforme exigido, para que sejam incluídos em conjuntos de dados macro-económicos;

6) O governo societário do Fundo Soberano deve ser sólido e estabelecer uma divisão clara e eficaz de funções e responsabilidades, visando facilitar a prestação de contas e a independência operacional da gestão do Fundo Soberano na prossecução dos seus objectivos;

7) O proprietário (Estado) deve definir os objectivos do Fundo Soberano, nomear os membros da sua equipa de gestão de acordo com procedimentos claramente definidos e supervisionar a sua actividade;

8) A administração/equipa de gestão deve actuar tendo em conta os melhores interesses do Fundo Soberano, ter um mandato claro e a autoridade e competências necessárias para concretizar as suas funções;

9) A gestão operacional do Fundo Soberano deve implementar as suas estratégias de maneira independente e em concordância com responsabilidades claramente definidas;

10) O quadro relativo a prestação de contas sobre as operações do Fundo Soberano deve estar claramente definido na legislação pertinente, no estatuto, em outros documentos constitutivos ou no contrato de gestão;

11) Deve ser preparado, de forma atempada, um relatório anual e demonstrações financeiras sobre as operações do Fundo Soberano, respeitando regras contabilísticas internacionais ou nacionais;

12) As operações e demonstrações financeiras do Fundo Soberano devem ser auditadas anualmente e em concordância com padrões internacionais ou nacionais de auditoria;

13) Os padrões profissionais e éticos da instituição deverão ser claramente definidos e transmitidos à administração, ao corpo directivo e a toda a equipa do Fundo Soberano;

14) A negociação com terceiros, para fins de gestão do Fundo Soberano, deverá ter fundamentos económicos e financeiros, seguindo regras e procedimentos claros;

15) As operações do Fundo Soberano devem ser conduzidas em conformidade com todos os requisitos regulatórios e de divulgação/transparência existentes nos países onde operem;

16) A estrutura e os objectivos do governo societário, bem como a forma como a administração do Fundo Soberano é operacionalmente independente do proprietário, devem ser divulgadas;

17) A informação financeira relevante referente ao Fundo Soberano deve ser divulgada para que se demonstre a sua orientação económica e financeira, contribuindo, assim, para a estabilidade dos mercados financeiros internacionais e para o reforço da confiança dos países receptores de investimento;

18) A política de investimento do Fundo Soberano deve ser clara e consistente com os seus objectivos definidos, tolerância ao risco e estratégia de investimento, conforme definido pelo proprietário ou pelo regulador e deve ser baseada em sólidos princípios de boa gestão de portfolio;

  18.1) A política de investimento deve orientar as exposições a riscos financeiros e o possível uso de alavancagem;

  18.2) A política de investimento deve abordar a funcionalidade dos gestores internos e externos, actividades, autoridade, o processo de selecção dos mesmos e os mecanismos que permitam monitorizar o seu desempenho;

  18.3) Deve ser divulgada uma descrição da política de investimento do Fundo Soberano;

19) As decisões de investimento do Fundo Soberano devem ter como objectivo maximizar os retornos financeiros ajustados aos riscos, de forma consistente com a sua política de investimentos e com base em fundamentos económicos e financeiros;

 19.1) Se as decisões de investimento estiverem sujeitas a considerações que não sejam económicas e financeiras, estas deverão constar na política de investimento e ser adequadamente divulgadas;

 19.2) A gestão dos activos de um Fundo Soberano deve coincidir com o que for geralmente aceite como princípios de boa gestão;

20) O Fundo Soberano não deve procurar e nem obter vantagem a partir de informações privilegiadas ou de influência junto do Governo, ao competir com entidades privadas;

21) O Fundo Soberano encara os direitos de propriedade dos accionistas como um elemento fundamental nos seus investimentos de capital. Se um Fundo Soberano optar por exercer os seus direitos de propriedade, deverá fazê-lo de modo consistente com a sua política de investimento e protegerá o valor financeiro dos seus investimentos. O Fundo Soberano deve, ainda, divulgar a sua abordagem geral aos valores mobiliários que confiram direito de voto em entidades cotadas em bolsa, incluindo os principais factores que orientam o exercício dos direitos de propriedade por si detidos;

22) O Fundo Soberano deve possuir uma estrutura que lhe permita identificar, avaliar e gerir os riscos das suas operações;

  22.1) A estrutura de gestão de riscos deve incorporar informações fiáveis e sistemas de relatório oportunos que devem permitir ou assegurar a monitorização e gestão adequadas de riscos relevantes dentro de parâmetros e níveis aceitáveis, mecanismos de controlo e de incentivo, códigos de conduta, planeamento da continuidade do negócio (business continuity planning) e uma função de auditoria independente;

  22.2) A abordagem do Fundo Soberano à gestão de risco deve ser divulgada;

23) O desempenho de activos e de investimentos (em absoluto ou relativamente à benchmarks, caso existam) do Fundo Soberano deve ser medido e reportado ao proprietário, em concordância com princípios ou padrões claramente definidos;

24) Deve ser realizado, com regularidade, um processo de revisão do estado de implementação dos PPC/GAAP no Fundo Soberano, pelo próprio ou em nome deste.




O PAPEL DE UM COMITÉ DE ÉTICA NUM FUNDO SOBERANO


 Partindo do que foi acima exposto, é possível concluir que uma grande preocupação entre os observadores tem sido o motivo subjacente aos investimentos realizados pelos SWFs, nomeadamente, se se tratam de investimentos realizados com propósitos puramente económicos e financeiros ou se são politicamente motivados. De modo a assegurar que os valores éticos estabelecidos no código de conduta do Fundo Soberano e que os seus investimentos têm propósitos económicos e financeiros e que este opera de forma transparente, recorre-se, por vezes, à criação de um Comité de Ética.
O Comité de Ética trata-se, então, de um órgão tem como finalidade reforçar o cumprimento do código de conduta de determinado Fundo Soberano, assegurando que o seu governo e os seus investimentos são realizados de acordo com os padrões éticos estabelecidos. A este comité, caberá ainda, aconselhar o órgão de administração e colaborar com as autoridades de supervisão, isto, com o propósito de assegurar a sua transparência e assim reforçar a confiança por parte dos investidores e dos mercados, de uma maneira geral.

Um mecanismo utilizado pelos Comités de Ética para a implementação de princípios de investimento ético consiste na "triagem negativa" e na exclusão de algumas empresas, países e sectores por motivos éticos específicos, em regra relacionados a protecção ambiental, a protecção dos direitos humanos e laborais (por vezes é atribuído o poder de veto ao Comité de Ética, em relação a investimentos que contrariem o código de ética do Fundo Soberano). No entanto, a adopção de directrizes de investimento ético tem as suas consequências. Por exemplo, um Fundo Soberano que adopte directrizes éticas que se consubstanciem na exclusão de sectores e empresas, vê limitado o seu universo de oportunidades de investimento, o que também pode afectar as tentativas de diversificação e as perspectivas de retorno, no entanto, o facto de o Government Pension Fund (GPF) norueguês, que é o maior Fundo Soberano do mundo e está avaliado em mais de 900 biliões de USD, ter políticas de investimento fortemente assentes em valores éticos, é muitas vezes utilizado como um contra-argumento.

Para além disto, o Comité de Ética também desempenha um importante papel enquanto garante de um governo societário transparente, uma vez que este também emite recomendações ao órgão de administração do Fundo Soberano em matéria de conflito de interesses, de modo a que estes sejam solucionados de maneira célere e transparente. Este também emite recomendações respeitantes ao activismo accionista do Fundo Soberano, nomeadamente, como este intervém nas empresas que façam parte do seu portfolio e cabe-lhe, igualmente, transmitir ao público o estado do cumprimento das regras de conduta e das políticas de investimento por parte do Fundo Soberano, devendo também cooperar com os reguladores em quaisquer matérias que contribuam para o aumento da transparência do Fundo Soberano.

Contudo, apesar do papel fulcral que um Comité de Ética pode desempenhar num Fundo Soberano enquanto garante da sua transparência, nem todos os Fundos Soberanos adoptam este organismo, o que naturalmente, levanta questionamentos sobre o seu real propósito (se é económico e financeiro ou político), sobre o seu compromisso com valores éticos, com a transparência e, principalmente, com a estabilidade do seu país de origem e com o bem-estar generalizado da sua população.


TIPOLOGIAS

Diferentes motivos conduzem à criação de um Fundo Soberano o que resulta, naturalmente, na existência de Fundos com objectivos e estratégias diferentes, sendo possível, então, classificá-los diferentemente.
Mas, antes de adentrarmos nas diferentes classificações dos Fundos Soberanos, importa referir alguns objectivos que lhes são comuns:

i) Proteger e estabilizar o Orçamento Geral do Estado e a economia de volatilidade excessiva em relação as receitas e/ou exportações;

ii) Diversificar a economia, nomeadamente, procura eliminar a dependência da exportação de commodities (entenda-se aqui, recursos não-renováveis);

iii) Obter maiores retornos que as reservas de divisas ou cambiárias;

iv) Auxiliar as autoridades monetárias a dissiparem liquidez indesejada;

v) Aumentar as poupanças para gerações futuras;

vi) Financiar o desenvolvimento económico e social;

vii) Possibilitar um crescimento sustentável a longo prazo;

viii) Auxiliar na execução de estratégias políticas (em regra ligadas à objectivos de desenvolvimento económico e social nacional).


Avançando agora para as classificações, veremos que os Fundos Soberanos podem ser classificados consoante o objectivo para o qual foram concebidos e consoante as estratégias de investimento que venham a adoptar.


Assim, segundo o seu objectivo, temos:


a) Fundos de Estabilização (económica);

b) Fundos de Poupanças ou para Gerações Futuras;

c) Fundos de Pensões;

d) Fundos de Investimento de Reservas;

e) SWFs/FS para Desenvolvimento Estratégico.


Estes últimos, os Fundos Soberanos para Desenvolvimento Estratégico ou Strategic Development Sovereign Wealth Funds (FSDE/SDSWF) assumem-se particularmente interessantes para uma realidade como a angolana, uma vez que estes visam promover o desenvolvimento económico (e não só) nacional. Em regra, estes são desenvolvidos com os seguintes objectivos orientadores:

I) Estabilização Doméstica ou Nacional: aqui, o SWF investe em activos domésticos ou numa empresa doméstica de modo a estabilizar os preços dos activos, gerar emprego e/ou impedir a insolvência de determinada entidade;

II) Criação de Indústrias e Geração de Emprego: aqui, o SWF adquire uma participação significativa ou o controlo total de determinada empresa que seja proprietária de tecnologia, controlos ou processos únicos ou que tenha acesso aos mesmos ou a matéria-prima. Uma vez adquirida esta participação significativa ou controlo por parte do SWF, a empresa deverá iniciar operações no país de origem do SWF (estabelecendo uma subsidiária, um centro de pesquisa, participando numa joint-venture ou mesmo alterando a sua sede). Isto permite, então, que se realize uma transferência estratégica de conhecimento para o país de origem do SWF enquanto que, simultaneamente, se criam postos de trabalho para a população do país de origem do SWF;

III) "Joint-venture" entre um Estado/país e uma Empresa: aqui, o SWF assina um memorando de entendimento (memorandum of understanding/MoU) com um Estado terceiro, que selecciona uma empresa nele domiciliada para receber investimento directo do SWF, devendo a empresa seleccionada vender os seus produtos para o país de origem do SWF e, se acordado, estabelecer operações nesse mesmo país;

IV) Possibilitar a Transferência de Recursos: aqui, mais uma vez, o SWF adquire uma participação significativa ou o controlo total de uma determinada empresa. No entanto, aqui, o SWF realiza esta operação com empresas que detenham recursos de que o seu país de origem (do SWF) necessite para satisfazer necessidades económicas ou de desenvolvimento.


Já quanto a estratégia de investimento, encontramos:


a) Fundos cuja estratégia visa realizar a preservação de capital (em regra controlados por Bancos Centrais ou por Autoridades Monetárias);

b) Fundos cuja estratégia visa o retorno do investimento e liquidez;

c) Fundos cuja estratégia visa o retorno do investimento e desenvolvimento económico e social nacional (utilizada, em regra, por SWFs orientados para o desenvolvimento estratégico);

d) Fundos que se servem de estratégias que visam apenas o retorno do investimento (muito utilizada por Fundos que são investidores inter-geracionais, ou seja, àqueles que sejam Fundos de Poupanças ou para Gerações Futuras).


Interessa referir aqui, também, as empresas criadas e detidas por um Fundo Soberano, as Sovereign Wealth Enterprises (SWE).

Tratam-se de veículos de investimento que são detidos e controlados por um Fundo Soberano e visam dotar o Fundo Soberano de maior flexibilidade, pois, o SWF pode estar sujeito a um plano de investimento muito restrito e a SWE pode ser criada de modo a operar dentro de parâmetros diferentes e mais flexíveis. Ainda, algumas SWEs são criadas de modo a que haja transparência operacional.
Ainda outras, podem ser criadas por questões de facilidade fiscal ou mesmo apenas para evitar operar sob a denominação de Fundo Soberano, contornando desta maneira, determinadas restrições regulatórias.



O LINABURG-MADUELL TRANSPARENCY INDEX

O Índice de Transparência Linaburg-Maduell (Linaburg-Maduell Transparency Index), desenvolvido pelo Sovereign Wealth Fund Institute (SWFI), consiste num mecanismo que permite medir os níveis de transparência dos Fundos Soberanos. Operacional desde 2008, este índice tem servido de benchmark internacional para os Fundos Soberanos em matéria de transparência, sendo integrado por muitos destes nos seus relatórios anuais.
Este índice consiste em 10 princípios essenciais que visam tornar os Fundos Soberanos transparentes ao público e a adequação a cada um deles confere um ponto na classificação de transparência atribuída a um Fundo Soberano concreto (uma pontuação máxima possível de 10 pontos).

Estes princípios são:

i) O Fundo Soberano deverá disponibilizar informação referente à sua história, nomeadamente, o motivo e objectivo da sua criação, origem dos fundos e estrutura de propriedade do Governo;

ii) O Fundo Soberano deverá disponibilizar, de maneira regular, os resultados de auditorias independentes feitas aos seus relatórios de contas anualmente;

iii) O Fundo Soberano deverá ceder informação sobre as suas participações (percentagens) e sobre a localização geográfica das empresas participadas;

iv) O Fundo Soberano deverá disponibilizar informação completa sobre o seu portfolio, sobre os retornos dos investimentos e sobre a compensação da(s) equipa(s) de gestão do mesmo;

v) O Fundo Soberano deverá desenvolver e implementar padrões de conduta ética, políticas de investimento e mecanismos que assegurem o cumprimento destes padrões e políticas;

vi) O Fundo Soberano deverá implementar estratégias e objectivos claros;

vii) Se aplicável, o Fundo Soberano deverá identificar às suas subsidiárias e informação de contacto;
viii) Se aplicável, o Fundo Soberano deverá identificar os gestores externos com que colabore;

ix) O Fundo Soberano deverá ser o responsável pela gestão do seu website;

x) O Fundo Soberano deverá disponibilizar informação referente ao local e contactos da sua sede.


Todavia, embora este índice tenha vindo a conferir alguma credibilidade aos Fundos Soberanos, ainda são levantados alguns questionamentos sobre a sua real imparcialidade, uma vez que se têm verificado que certos Fundos Soberanos com classificações muito altas neste índice, não demonstram ser verdadeiramente transparentes e estão, muitas vezes envolvidos em escândalos ligados a operações de evasão fiscal e de branqueamento de capitais.



CONCLUSÃO (parcial)

Os SWFs, em regra, assumem um papel central nos seus países de origem enquanto um instrumento auxiliar na gestão das finanças públicas, na manutenção da estabilidade macro-económica e num crescimento (nacional) saudável. Os SWFs também trazem benefícios substanciais para os mercados financeiros (e não só), isto devido a sua capacidade de investirem a longo prazo e assim atravessarem diversos ciclos de mercado, o que contribui para a diversificação dos mercados financeiros globais e é particularmente importante em situações de contracção dos mercados (bear market) ou da economia, de uma maneira geral.

Na próxima entrada, analisaremos alguns dos Fundos Soberanos que hoje desenvolvem a sua actividade em diferentes realidades.




Elaborado por: Dr. Elvis Barros




BIBLIOGRAFIA


BRAUNSTEIN, Jurgen - Sovereign Wealth Funds and Ethical Investment Guidelines: The Role of Regime Type, World Bank Group, Finance&Markets, London, UK, 2017.

International Working Group of Sovereign Wealth Funds (IWG) - Sovereign Wealth Funds: Generally Accepted Principles and Practices "Santiago Principles", Santiago, Chile, 2008.

STUCKELBERGER, Christoph / ROSSOUW, Deon / GEERTS, Sofie / CHAVAZ, Pascale / XINWA, Namhla - Sovereign Wealth Funds: An Ethical Perspective, Geneva, Globethics.net, 2016.



   



Comentários

  1. Parabéns. Simples e claro. Aguardo pelo segundo artigo, espero que te focalizes no Fundo Angolano, há muito por se dizer, assim como trazer propostas para a nova gestão do mesmo. Força.

    ResponderEliminar
  2. grande artigo, gostei muito da iniciativa , e espero pela 2ª parte

    ResponderEliminar
  3. Muito bom este artigo, está ser bastante útil para a minha monografia. Portanto, gostaria que pudesse partilhar os artigos taxativos da Convenção de Santiago

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares