FUNDOS SOBERANOS
CONCEITO E CARACTERIZAÇÃO
Os Fundos Soberanos (FS) ou Sovereign Wealth Funds (SWF), são
Organismos de Investimento Colectivo (OIC) especiais ou de escopo e são detidos
por um determinado Estado. Estes são desenvolvidos para cumprirem desígnios macro-económicos
e administram um volume significativo de activos com o propósito de atingirem
objectivos financeiros, recorrendo a estratégias de investimento que incluem
investir em activos no mercado internacional. Em regra, estes são desenvolvidos
de modo a não constarem do balancete de superavits fiscais, receitas advindas
de privatizações, de operações oficiais em moeda estrangeira e de pagamentos de
excedentes.
Esta definição exclui, inter alia: reservas de divisas detidas por
autoridades monetárias; operações de empresas públicas (no sentido
tradicional); fundos de pensões de funcionários públicos e outros activos que
sejam administrados em benefício de indivíduos.
Alguns fundos soberanos podem ser controlados por um banco central, que
concentra os fundos no decurso da administração do sistema bancário. Este tipo
de fundo assume, geralmente, grande relevância económica e fiscal. Outros, são
simplesmente as poupanças estatais que são investidas por várias entidades para
fins de retorno do investimento e que podem não ter um papel significativo na
gestão fiscal (nestes casos, constitui-se, em regra, uma entidade
independente).
E cabe ao Governo do Estado onde o SWF tenha sido implementado, definir as
regras relativas: a concentração ou acumulação de activos (limites máximos e
mínimos de investimento e poupanças); o montante que pode ser retirado do Fundo
e em que circunstâncias pode ser retirado; e em que classe de activos, sejam
domésticos ou externos, o Fundo poderá investir.
Os fundos concentrados podem originar (de) ou representar depósitos em
moeda estrangeira, ouro, Direitos Especiais de Saque (os Special Drawing
Rights/SDRs), isto, juntamente com outros activos nacionais como fundos
petrolíferos ou outras participações industriais e financeiras. Esses são
activos das nações soberanas que normalmente são mantidos em moedas de reserva
domésticas e diferentes (como o dólar ou o euro).
Estas entidades podem ser estabelecidas como empresas de investimento,
fundos de pensões estatais, entre outros.
Importa, ainda, distinguir entre fundos detidos por entidades soberanas
e reservas em moeda estrangeira detidas por bancos centrais, onde se compreende
que: os fundos soberanos são caracterizados como instrumentos que procuram
maximizar o retorno a longo prazo; já as reservas cambiais operam
como "estabilizadores cambiais" de curto prazo e como
instrumentos de gestão da liquidez.
No entanto, estes instrumentos (os SWF), desenhados para maximizarem a
riqueza pública e, assim, assegurarem, de alguma maneira, o futuro financeiro
dos cidadãos como um todo, também levantam alguns questionamentos.
Com a expansão da "pool" de activos de um SWF, quer em
dimensão, quer em importância, o seu potencial impacto sobre uma determinada
classe de activos ou mercado também aumenta, o que leva a que alguns países
receiem que investimentos feitos por SWFs possam levantar riscos para a
segurança nacional, pois, coloca-se a possibilidade de que certos investimentos
visem conseguir o controlo de determinada indústria estrategicamente relevante,
não com objectivos financeiros, mas sim políticos. Isto tem originado debates,
em algumas realidades, sobre a necessidade de se desenvolver ou aplicar
instrumentos destinados a limitar ou mesmo impossibilitar investimentos por
parte de SWFs em países terceiros. Porém, enquanto alguns procuram apartar tal
possibilidade por receio de isto resultar em políticas proteccionistas (em
demasia), outros procuram concretizar tais instrumentos.
Para além disso, a falta de transparência de muitos Fundos Soberanos (mesmo
com a elaboração dos Princípios de Santiago, que servem de preceitos
orientadores da actividade dos SWFs, muitos continuam a apresentar questões de
transparência) revela ser uma preocupação (legítima) de muitos investidores e
reguladores, nomeadamente, a falta ou inadequada transparência relativamente a
dimensão real do Fundo, objectivos e estratégias de investimento, governo
societário/corporate governance (em particular, os mecanismos instalados
para a resolução de conflitos de interesses) e participações que detenham em
fundos de private equity.
Note-se, também, que apesar de terem uma importante função do ponto de vista
macro-económico, os SWfs, em regra, não intervêm directamente nas políticas
macro-económicas, excepto quando:
i) Seja necessário realizar transferências para o Orçamento Geral do Estado,
de modo a suprir necessidades específicas e resultantes de situações
excepcionais;
ii) Quando se verifique a necessidade deste ceder fundos ao Banco Central
para que este possa suprir deficiências da balança de pagamentos ou satisfazer
políticas monetárias, isto, sempre em situações excepcionais;
iii) Seja necessário estabilizar certos sectores ou empresas que sejam
vitais para a economia nacional (isto quando outros mecanismos se provem
insuficientes ou ineficazes).
PRINCÍPIOS DE SANTIAGO
Como já foi referido, este tipo de organismo levantou (e continua a
levantar, embora, agora com menor intensidade) questões concernentes à sua
falta de transparência (em diversas dimensões) o que levou a que de 2 a 3 de
Setembro de 2008, no Chile, alguns dos principais Fundos Soberanos do mundo se
reunissem com o intuito de formarem um Grupo de Trabalho de Fundos Soberanos
temporário, de onde emergiram os 24 Princípios de Santiago. Estes consistem num
conjunto de padrões internacionais relativos a transparência, independência e
responsabilização dos SWFs, na prossecução dos objectivos para os quais foram
concebidos.
Estes Princípios foram publicados depois de apresentados ao Comité Monetário
Internacional do FMI, a 11 de Outubro de 2008. Daqui também resultou a criação
do International Forum of Sovereign Wealth Funds (IFSWF), o Fórum
Internacional de Fundos Soberanos (FIFS), ao qual compete supervisionar o cumprimento destes Princípios e representar os Fundos Soberanos em debates
sobre políticas internacionais.
Desenvolvidos, então, para garantirem e demonstrarem que as decisões de
investimento tomadas por Fundos Soberanos têm fundamentação e propósito
económico e financeiro (procurando afastar, assim, os receios dos países
terceiros ou de destino do investimento de que este seja politicamente
motivado), estes Princípios e Práticas Comuns/PPC (Generally Accepted Principles
and Practices/GAPP) têm como objectivos orientadores:
i) Contribuir para a estabilidade do sistema financeiro global e da livre
circulação de capital e de investimentos;
ii) Adequar os SWFs à estrutura regulatória e aos requisitos de transparência
dos países onde investem;
iii) Realizar investimentos observando a relação risco-retorno (económico e
financeiro);
iv) Desenvolver e implementar uma estrutura de corporate governance
que contemple controlos operacionais, mecanismos de gestão de risco e
responsabilização por parte da entidade e da sua administração.
O propósito dos PPC/GAPP é, então, providenciar uma estrutura de governo
societário, que seja ampla e aceitável para todos os SWF e também pelos
reguladores e investidores, bem como a de estabelecer práticas comuns de
investimento (entenda-se aqui, a conduta que os SWFs devem adoptar quando
estabelecem estratégias de investimento), procurando dotar os SWFs de maior
transparência, rigorosidade e solidez.
Todavia, tratam-se de princípios que os SWFs adoptam voluntariamente para
que exista um padrão de conduta comum a todos, cabendo aos países de origem ou
mesmo aos países destinatários de investimento, transporem estes princípios
para os seus ordenamentos para assim lhes conferirem força legal, o que também
contribui para uma aproximação entre as diferentes estruturas regulatórias
nacionais (note-se que algumas estruturas regulatórias já correspondem, em
maior ou menor grau, com os PPC/GAAP, mesmo sem se proceder à sua
transposição).
Ainda, estruturalmente, os PPC/GAAP, desdobram-se da seguinte maneira:
i) Procuram sintonizar-se ou coordenar com o ordenamento jurídico e com os
objectivos das políticas macro-económicas;
ii) Procuram providenciar uma estrutura institucional e de governo societário;
iii) Procuram providenciar uma estrutura sobre as políticas de investimento
e mecanismos de gestão de risco.
Essencialmente, os PPC/GAAP procuram providenciar uma estrutura
institucional e de governo societário que seja robusta e que facilite a
formulação de estratégias de investimento consistentes com os objectivos
definidos para o SWF em concreto. Isto exige, então, que se implemente uma
estrutura de governo societário que separe o proprietário do corpo governativo
e da gestão, possibilita uma independência operacional na gestão do SWF,
garantindo que as suas decisões de investimento não se sujeitam à vontades ou
interesses políticos. Uma política de investimento clara demonstra que o SWF
está comprometido com um plano e práticas de investimento disciplinadas e a
implementação de mecanismos de gestão de risco que sejam funcionais (e
transparentes) promovem uma melhor ou maior responsabilização relativamente aos
investimentos realizados.
Recorde-se, também, que a transparência é e deve ser um aspecto importante
não apenas para os reguladores e para os investidores, mas também para os
cidadãos do país de origem do Fundo Soberano, pois, são estes os seus
proprietários e beneficiários últimos, representados pelo Estado.
Importa agora enumerar estes princípios, para que se possa compreender
melhor o acima exposto:
1) O regime jurídico do Fundo Soberano deverá permitir que este concretize o
seu objectivo de forma eficaz;
1.1) O regime jurídico deverá assegurar solidez legal ao Fundo
Soberano e às suas transacções/investimentos;
1.2) A estrutura legal do Fundo Soberano e as suas relações com
órgãos públicos devem ser de conhecimento público;
2) A política do Fundo Soberano deve ser clara e publicamente conhecida;
3) As actividades do Fundo Soberano que tenham um impacto directo
significativo em questões macro-económicas domésticas, deverão ser coordenadas
com as autoridades monetária e fiscal para que exista coerência com as
políticas macro-económicas;
4) Deverão ser divulgadas as políticas, regras, procedimentos ou acordos
referentes as operações de financiamento, de levantamento/desinvestimento e de
gastos do Fundo Soberano;
4.1) A origem dos fundos do Fundo Soberano deve ser divulgada;
4.2) A abordagem quanto ao levantamento/retirada (de fundos) e aos
gastos feitos em nome do Governo deve ser divulgada;
5) Os dados estatísticos relevantes referentes ao Fundo Soberano devem ser
reportados ao proprietário (Estado) em tempo hábil ou conforme exigido, para
que sejam incluídos em conjuntos de dados macro-económicos;
6) O governo societário do Fundo Soberano deve ser sólido e estabelecer uma
divisão clara e eficaz de funções e responsabilidades, visando facilitar a
prestação de contas e a independência operacional da gestão do Fundo Soberano
na prossecução dos seus objectivos;
7) O proprietário (Estado) deve definir os objectivos do Fundo Soberano,
nomear os membros da sua equipa de gestão de acordo com procedimentos
claramente definidos e supervisionar a sua actividade;
8) A administração/equipa de gestão deve actuar tendo em conta os melhores
interesses do Fundo Soberano, ter um mandato claro e a autoridade e
competências necessárias para concretizar as suas funções;
9) A gestão operacional do Fundo Soberano deve implementar as suas
estratégias de maneira independente e em concordância com responsabilidades
claramente definidas;
10) O quadro relativo a prestação de contas sobre as operações do Fundo Soberano
deve estar claramente definido na legislação pertinente, no estatuto, em outros
documentos constitutivos ou no contrato de gestão;
11) Deve ser preparado, de forma atempada, um relatório anual e
demonstrações financeiras sobre as operações do Fundo Soberano, respeitando
regras contabilísticas internacionais ou nacionais;
12) As operações e demonstrações financeiras do Fundo Soberano devem ser
auditadas anualmente e em concordância com padrões internacionais ou nacionais
de auditoria;
13) Os padrões profissionais e éticos da instituição deverão ser claramente
definidos e transmitidos à administração, ao corpo directivo e a toda a equipa
do Fundo Soberano;
14) A negociação com terceiros, para fins de gestão do Fundo Soberano,
deverá ter fundamentos económicos e financeiros, seguindo regras e
procedimentos claros;
15) As operações do Fundo Soberano devem ser conduzidas em conformidade com
todos os requisitos regulatórios e de divulgação/transparência existentes nos
países onde operem;
16) A estrutura e os objectivos do governo societário, bem como a forma como
a administração do Fundo Soberano é operacionalmente independente do
proprietário, devem ser divulgadas;
17) A informação financeira relevante referente ao Fundo Soberano deve ser
divulgada para que se demonstre a sua orientação económica e financeira,
contribuindo, assim, para a estabilidade dos mercados financeiros
internacionais e para o reforço da confiança dos países receptores de
investimento;
18) A política de investimento do Fundo Soberano deve ser clara e
consistente com os seus objectivos definidos, tolerância ao risco e estratégia
de investimento, conforme definido pelo proprietário ou pelo regulador e deve
ser baseada em sólidos princípios de boa gestão de portfolio;
18.1) A política de investimento deve orientar as exposições a riscos
financeiros e o possível uso de alavancagem;
18.2) A política de investimento deve abordar a funcionalidade dos
gestores internos e externos, actividades, autoridade, o processo de selecção
dos mesmos e os mecanismos que permitam monitorizar o seu desempenho;
18.3) Deve ser divulgada uma descrição da política de investimento do
Fundo Soberano;
19) As decisões de investimento do Fundo Soberano devem ter como objectivo
maximizar os retornos financeiros ajustados aos riscos, de forma consistente
com a sua política de investimentos e com base em fundamentos económicos e
financeiros;
19.1) Se as decisões de investimento estiverem sujeitas a
considerações que não sejam económicas e financeiras, estas deverão constar na
política de investimento e ser adequadamente divulgadas;
19.2) A gestão dos activos de um Fundo Soberano deve coincidir com o
que for geralmente aceite como princípios de boa gestão;
20) O Fundo Soberano não deve procurar e nem obter vantagem a partir de
informações privilegiadas ou de influência junto do Governo, ao competir com
entidades privadas;
21) O Fundo Soberano encara os direitos de propriedade dos accionistas como
um elemento fundamental nos seus investimentos de capital. Se um Fundo Soberano
optar por exercer os seus direitos de propriedade, deverá fazê-lo de modo
consistente com a sua política de investimento e protegerá o valor financeiro
dos seus investimentos. O Fundo Soberano deve, ainda, divulgar a sua abordagem
geral aos valores mobiliários que confiram direito de voto em entidades cotadas
em bolsa, incluindo os principais factores que orientam o exercício dos
direitos de propriedade por si detidos;
22) O Fundo Soberano deve possuir uma estrutura que lhe permita identificar,
avaliar e gerir os riscos das suas operações;
22.1) A estrutura de gestão de riscos deve incorporar informações
fiáveis e sistemas de relatório oportunos que devem permitir ou assegurar a
monitorização e gestão adequadas de riscos relevantes dentro de parâmetros e
níveis aceitáveis, mecanismos de controlo e de incentivo, códigos de conduta,
planeamento da continuidade do negócio (business continuity planning) e
uma função de auditoria independente;
22.2) A abordagem do Fundo Soberano à gestão de risco deve ser
divulgada;
23) O desempenho de activos e de investimentos (em absoluto ou relativamente
à benchmarks, caso existam) do Fundo Soberano deve ser medido e
reportado ao proprietário, em concordância com princípios ou padrões claramente
definidos;
24) Deve ser realizado, com regularidade, um processo de revisão do estado
de implementação dos PPC/GAAP no Fundo Soberano, pelo próprio ou em nome deste.
O PAPEL DE UM COMITÉ DE ÉTICA NUM FUNDO SOBERANO
Partindo do que foi acima exposto, é possível concluir que uma grande
preocupação entre os observadores tem sido o motivo subjacente aos
investimentos realizados pelos SWFs, nomeadamente, se se tratam de
investimentos realizados com propósitos puramente económicos e financeiros ou
se são politicamente motivados. De modo a assegurar que os valores éticos
estabelecidos no código de conduta do Fundo Soberano e que os seus
investimentos têm propósitos económicos e financeiros e que este opera de forma
transparente, recorre-se, por vezes, à criação de um Comité de Ética.
O Comité de Ética trata-se, então, de um órgão tem como finalidade
reforçar o cumprimento do código de conduta de determinado Fundo Soberano,
assegurando que o seu governo e os seus investimentos são realizados de acordo
com os padrões éticos estabelecidos. A este comité, caberá ainda, aconselhar o
órgão de administração e colaborar com as autoridades de supervisão, isto, com
o propósito de assegurar a sua transparência e assim reforçar a confiança por
parte dos investidores e dos mercados, de uma maneira geral.
Um mecanismo utilizado pelos Comités de Ética para a implementação de
princípios de investimento ético consiste na "triagem negativa" e na
exclusão de algumas empresas, países e sectores por motivos éticos específicos,
em regra relacionados a protecção ambiental, a protecção dos direitos humanos e
laborais (por vezes é atribuído o poder de veto ao Comité de Ética, em relação
a investimentos que contrariem o código de ética do Fundo Soberano). No
entanto, a adopção de directrizes de investimento ético tem as suas
consequências. Por exemplo, um Fundo Soberano que adopte directrizes éticas que
se consubstanciem na exclusão de sectores e empresas, vê limitado o seu universo
de oportunidades de investimento, o que também pode afectar as tentativas de
diversificação e as perspectivas de retorno, no entanto, o facto de o
Government Pension Fund (GPF) norueguês, que é o maior Fundo Soberano do mundo
e está avaliado em mais de 900 biliões de USD, ter políticas de investimento
fortemente assentes em valores éticos, é muitas vezes utilizado como um
contra-argumento.
Para além disto, o Comité de Ética também desempenha um importante papel
enquanto garante de um governo societário transparente, uma vez que este também
emite recomendações ao órgão de administração do Fundo Soberano em matéria de
conflito de interesses, de modo a que estes sejam solucionados de maneira
célere e transparente. Este também emite recomendações respeitantes ao
activismo accionista do Fundo Soberano, nomeadamente, como este intervém nas
empresas que façam parte do seu portfolio e cabe-lhe, igualmente, transmitir ao
público o estado do cumprimento das regras de conduta e das políticas de
investimento por parte do Fundo Soberano, devendo também cooperar com os
reguladores em quaisquer matérias que contribuam para o aumento da
transparência do Fundo Soberano.
Contudo, apesar do papel fulcral que um Comité de Ética pode desempenhar num
Fundo Soberano enquanto garante da sua transparência, nem todos os Fundos
Soberanos adoptam este organismo, o que naturalmente, levanta questionamentos
sobre o seu real propósito (se é económico e financeiro ou político), sobre o
seu compromisso com valores éticos, com a transparência e, principalmente, com
a estabilidade do seu país de origem e com o bem-estar generalizado da sua
população.
TIPOLOGIAS
Diferentes motivos conduzem à criação de um Fundo Soberano o que resulta,
naturalmente, na existência de Fundos com objectivos e estratégias diferentes,
sendo possível, então, classificá-los diferentemente.
Mas, antes de adentrarmos nas diferentes classificações dos Fundos
Soberanos, importa referir alguns objectivos que lhes são comuns:
i) Proteger e estabilizar o Orçamento Geral do Estado e a economia de
volatilidade excessiva em relação as receitas e/ou exportações;
ii) Diversificar a economia, nomeadamente, procura eliminar a dependência da
exportação de commodities (entenda-se aqui, recursos não-renováveis);
iii) Obter maiores retornos que as reservas de divisas ou cambiárias;
iv) Auxiliar as autoridades monetárias a dissiparem liquidez indesejada;
v) Aumentar as poupanças para gerações futuras;
vi) Financiar o desenvolvimento económico e social;
vii) Possibilitar um crescimento sustentável a longo prazo;
viii) Auxiliar na execução de estratégias políticas (em regra ligadas à
objectivos de desenvolvimento económico e social nacional).
Avançando agora para as classificações, veremos que os Fundos Soberanos
podem ser classificados consoante o objectivo para o qual foram concebidos e
consoante as estratégias de investimento que venham a adoptar.
Assim, segundo o seu objectivo, temos:
a) Fundos de Estabilização (económica);
b) Fundos de Poupanças ou para Gerações Futuras;
c) Fundos de Pensões;
d) Fundos de Investimento de Reservas;
e) SWFs/FS para Desenvolvimento Estratégico.
Estes últimos, os Fundos Soberanos para Desenvolvimento Estratégico ou
Strategic Development Sovereign Wealth Funds (FSDE/SDSWF) assumem-se
particularmente interessantes para uma realidade como a angolana, uma vez que
estes visam promover o desenvolvimento económico (e não só) nacional. Em regra,
estes são desenvolvidos com os seguintes objectivos orientadores:
I) Estabilização Doméstica ou Nacional:
aqui, o SWF investe em activos domésticos ou numa empresa doméstica de modo a
estabilizar os preços dos activos, gerar emprego e/ou impedir a insolvência de
determinada entidade;
II) Criação de Indústrias e Geração de Emprego:
aqui, o SWF adquire uma participação significativa ou o controlo total de
determinada empresa que seja proprietária de tecnologia, controlos ou processos
únicos ou que tenha acesso aos mesmos ou a matéria-prima. Uma vez adquirida
esta participação significativa ou controlo por parte do SWF, a empresa deverá
iniciar operações no país de origem do SWF (estabelecendo uma subsidiária, um
centro de pesquisa, participando numa joint-venture ou mesmo alterando a sua sede).
Isto permite, então, que se realize uma transferência estratégica de
conhecimento para o país de origem do SWF enquanto que, simultaneamente, se
criam postos de trabalho para a população do país de origem do SWF;
III) "Joint-venture" entre um Estado/país
e uma Empresa: aqui, o SWF assina um memorando de entendimento
(memorandum of understanding/MoU) com um Estado terceiro, que selecciona uma
empresa nele domiciliada para receber investimento directo do SWF, devendo a
empresa seleccionada vender os seus produtos para o país de origem do SWF e, se
acordado, estabelecer operações nesse mesmo país;
IV) Possibilitar a Transferência de Recursos:
aqui, mais uma vez, o SWF adquire uma participação significativa ou o controlo
total de uma determinada empresa. No entanto, aqui, o SWF realiza esta operação
com empresas que detenham recursos de que o seu país de origem (do SWF)
necessite para satisfazer necessidades económicas ou de desenvolvimento.
Já quanto a estratégia de investimento, encontramos:
a) Fundos cuja estratégia visa realizar a preservação de capital (em regra
controlados por Bancos Centrais ou por Autoridades Monetárias);
b) Fundos cuja estratégia visa o retorno do investimento e liquidez;
c) Fundos cuja estratégia visa o retorno do investimento e desenvolvimento
económico e social nacional (utilizada, em regra, por SWFs orientados para o
desenvolvimento estratégico);
d) Fundos que se servem de estratégias que visam apenas o retorno do
investimento (muito utilizada por Fundos que são investidores
inter-geracionais, ou seja, àqueles que sejam Fundos de Poupanças ou para
Gerações Futuras).
Interessa referir aqui, também, as empresas criadas e detidas por um Fundo
Soberano, as Sovereign Wealth Enterprises (SWE).
Tratam-se de veículos de investimento que são detidos e controlados por um
Fundo Soberano e visam dotar o Fundo Soberano de maior flexibilidade, pois, o
SWF pode estar sujeito a um plano de investimento muito restrito e a SWE pode
ser criada de modo a operar dentro de parâmetros diferentes e mais flexíveis.
Ainda, algumas SWEs são criadas de modo a que haja transparência operacional.
Ainda outras, podem ser criadas por questões de facilidade fiscal ou mesmo
apenas para evitar operar sob a denominação de Fundo Soberano, contornando
desta maneira, determinadas restrições regulatórias.
O LINABURG-MADUELL TRANSPARENCY INDEX
O Índice de Transparência Linaburg-Maduell (Linaburg-Maduell Transparency
Index), desenvolvido pelo Sovereign Wealth Fund Institute (SWFI),
consiste num mecanismo que permite medir os níveis de transparência dos Fundos
Soberanos. Operacional desde 2008, este índice tem servido de benchmark
internacional para os Fundos Soberanos em matéria de transparência, sendo
integrado por muitos destes nos seus relatórios anuais.
Este índice consiste em 10 princípios essenciais que visam tornar os Fundos
Soberanos transparentes ao público e a adequação a cada um deles confere um
ponto na classificação de transparência atribuída a um Fundo Soberano concreto
(uma pontuação máxima possível de 10 pontos).
Estes princípios são:
i) O Fundo Soberano deverá disponibilizar informação referente à sua
história, nomeadamente, o motivo e objectivo da sua criação, origem dos fundos
e estrutura de propriedade do Governo;
ii) O Fundo Soberano deverá disponibilizar, de maneira regular, os resultados
de auditorias independentes feitas aos seus relatórios de contas anualmente;
iii) O Fundo Soberano deverá ceder informação sobre as suas participações
(percentagens) e sobre a localização geográfica das empresas participadas;
iv) O Fundo Soberano deverá disponibilizar informação completa sobre o seu
portfolio, sobre os retornos dos investimentos e sobre a compensação da(s)
equipa(s) de gestão do mesmo;
v) O Fundo Soberano deverá desenvolver e implementar padrões de conduta
ética, políticas de investimento e mecanismos que assegurem o cumprimento
destes padrões e políticas;
vi) O Fundo Soberano deverá implementar estratégias e objectivos claros;
vii) Se aplicável, o Fundo Soberano deverá identificar às suas subsidiárias
e informação de contacto;
viii) Se aplicável, o Fundo Soberano deverá identificar os gestores externos
com que colabore;
ix) O Fundo Soberano deverá ser o responsável pela gestão do seu website;
x) O Fundo Soberano deverá disponibilizar informação referente ao local e
contactos da sua sede.
Todavia, embora este índice tenha vindo a conferir alguma credibilidade aos
Fundos Soberanos, ainda são levantados alguns questionamentos sobre a sua real
imparcialidade, uma vez que se têm verificado que certos Fundos Soberanos com
classificações muito altas neste índice, não demonstram ser verdadeiramente
transparentes e estão, muitas vezes envolvidos em escândalos ligados a
operações de evasão fiscal e de branqueamento de capitais.
CONCLUSÃO (parcial)
Os SWFs, em regra, assumem um papel central nos seus países de origem
enquanto um instrumento auxiliar na gestão das finanças públicas, na manutenção
da estabilidade macro-económica e num crescimento (nacional) saudável. Os SWFs
também trazem benefícios substanciais para os mercados financeiros (e não só),
isto devido a sua capacidade de investirem a longo prazo e assim atravessarem
diversos ciclos de mercado, o que contribui para a diversificação dos mercados
financeiros globais e é particularmente importante em situações de contracção
dos mercados (bear market) ou da economia, de uma maneira geral.
Na próxima entrada, analisaremos alguns dos Fundos Soberanos que hoje desenvolvem a sua actividade em diferentes realidades.
Elaborado por: Dr. Elvis Barros
BIBLIOGRAFIA
BRAUNSTEIN, Jurgen - Sovereign Wealth Funds and Ethical Investment
Guidelines: The Role of Regime Type, World Bank Group,
Finance&Markets, London, UK, 2017.
International Working Group of Sovereign Wealth Funds (IWG) - Sovereign Wealth Funds: Generally Accepted Principles and Practices "Santiago Principles", Santiago, Chile, 2008.
STUCKELBERGER, Christoph / ROSSOUW, Deon / GEERTS, Sofie / CHAVAZ, Pascale / XINWA, Namhla - Sovereign Wealth Funds: An Ethical Perspective, Geneva, Globethics.net, 2016.
Parabéns. Simples e claro. Aguardo pelo segundo artigo, espero que te focalizes no Fundo Angolano, há muito por se dizer, assim como trazer propostas para a nova gestão do mesmo. Força.
ResponderEliminarMuito obrigado, Josefa!
Eliminargrande artigo, gostei muito da iniciativa , e espero pela 2ª parte
ResponderEliminarMuito bom este artigo, está ser bastante útil para a minha monografia. Portanto, gostaria que pudesse partilhar os artigos taxativos da Convenção de Santiago
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