PROJECT FINANCE




















CONCEITO E CARACTERIZAÇÃO

Quanto a este tipo de contrato, podemos reter duas acepções:

- O Project Finance é um método de obtenção de financiamento a longo prazo, para projectos de grande porte, através de uma engenharia financeira baseada em empréstimos contra o cash flow gerado pelo projecto, da operação e dos riscos e da sua alocação entre entidades mutuantes ou outras partes, através de arranjos contratuais ou diversos. (E. R. Yescombe);

- Projektfinanzierung é um financiamento a longo prazo de um investimento separável e economicamente auto-sustentável, com ou sem responsabilidade limitada aos participantes no projecto (non-recourse ou limited-recourse finanzierung). (Oliver Rossbach).

Como se pode depreender desta última noção, é característico do Project Finance a centralização do projecto numa sociedade de capitais, juridicamente autónoma, constituída pelos patrocinadores.
O Project Finance tem ainda um campo de eleição na realização de obras públicas ou de interesse público, tais como túneis, vias de comunicação, aeroportos, auto-estradas, pontes e telecomunicações. Nessa eventualidade, o sponsor pode ser o Estado ou entidade equivalente; é igualmente possível a associação e capitais públicos, também antecipados com vista no futuro cash flow ou a angariação, pelo Estado, de financiadores, com recurso às garantias. Temos as PPP (parecerias público-privadas ou Public Private Parterships), puras ou associadas a privatizações.
Assim, este esquema visa grandes empreendimentos, de previsível rendibilidade e nos quais os promotores não pretendem colocar mais de 20% de capitais próprios. Eventualmente, nenhuns capitais próprios.



ESTRUTURA

Quanto a estrutura básica de Project Finance, temos, essencialmente, o seguinte sistema:

- Um promotor/sponsor, que detém os direitos básicos ao projecto, seja por lhe caberem de raiz, seja por lhe terem sido adjudicados;

- Uma Sociedade-Veículo Autónoma ou SPV (Special Purpose Vehicle), que contrata os financiamentos e assume a direcção da obra;

- Um esquema de financiamento, seja pelo recurso ao mercado de capitais, seja pela intervenção de um banqueiro ou de sindicatos bancários;

- A captação do cash flow, o qual é usado, desde logo, como garantia;

- Uma série de Financial Covenants, a cargo do mutuário e que vão ser seguidos pelos financiadores, que recebem poderes de acompanhamento e de fiscalização apertados, relativamente ao desenrolar do projecto;

- Um esquema de repartição equitativa e predeterminada de riscos.

Quanto ao sponsor e a SPV, existe uma estrita separação entre estes dois, o que constitui um ponto básico deste tipo contratual. Ele não corre riscos, para além dos fundos que, eventualmente, coloque no projecto (pode também não colocar nenhuns). Em termos práticos, opera o non-recourse, pois, o sponsor não garante (ou não tem de garantir) qualquer reembolso.
No Project Finance, o projecto ganha vida e alimenta-se a si mesmo, independentemente do promotor, que alija os riscos.
Esse esquema permite, ao promotor, manter a iniciativa e os seus riscos e encargos fora do seu balanço (off balance sheet), conservando margem para outras iniciativas. Tratando-se do Estado, este consegue promover obras públicas com uma total desorçamentação.
 Dada a separação total do SPV, nada mais há a oferecer como garantia, do que o capital deste e o cash flow previsível. Isso obriga as entidades financiadoras a estudar profundamente o projecto e as suas perspectivas. A capacidade económica do próprio projecto vai suportar todo o funding da operação.
O risco maior, para os financiadores, residirá na eventualidade de o projecto não ser concluído: só nesta altura principia o retorno constituído pelo cash flow. Um projecto bem estruturado, numa área com futuro e com adequada gestão, minimiza esse risco. Concluído o projecto, o risco quase desaparece.
O projecto e a sua prossecução tornam-se, pois, decisivos. Daí que os financiadores se rodeiem de cautelas contratuais para, em permanência, acompanharem a SPV e as suas actuações, quer no plano financeiro, quer no domínio técnico. Essas cautelas tomam corpo em cláusulas adequadas, que permitem uma total e permanente informação.



TIPOLOGIAS DO PROJECT FINANCE

No que diz respeito às técnicas, modalidades ou tipologias que pode assumir o Project Finance estas são variadíssimas.
Em primeiro lugar, temos a modalidade Build, Own and Operate (BOO). Neste tipo contratual, a infra-estrutura construída mantém-se na esfera jurídica da sociedade de projecto. Os benefícios da gestão do empreendimento permanecem na sociedade de projecto.
Neste ponto, são prementes os sectores económicos sujeitos a privatizações.
Por outro lado, nos modelos Build Operate and Transfer (BOT), o SPV assume os riscos de realização do projecto, bem como da sua exploração. Findo o prazo de concessão, a infra-estrutura produzida é transferida novamente para o ente público em troca de uma compensação ao parceiro privado. A transferência para o ente público pode acontecer quer por termo do prazo da concessão, quer pela verificação de um conjunto de condições apostas no contrato de concessão e que salvaguardam o projecto. Deste modo, o ente público assume a gestão do mesmo sempre que o parceiro privado atravesse elevadas dificuldades ou o projecto se mostre pouco viável. Falamos aqui, portanto, do resgate do projecto.
Como variações da modalidade anterior apresentam-se a Design, Build, Finance, Own and Transfer (DBFOT), Finance, Build, Own, Operate and Transfer (FBOOT), Design, Build, Operate and Maintain (DBOM), Build, Operate and Deliver (BOD), Build, Rent and Transfer (BRT), Build, Own, Operate, Subsidize and Transfer (BOOST) e  Design, Build, Operate and Transfer (DBOT).



CONTRATOS GERALMENTE ASSOCIADOS AO PROJECT FINANCE

Ao contrato de Project Finance, podem estar associados uma multiplicidade de contratos. Tomemos os seguintes exemplos, sem qualquer carácter exaustivo:

O Project Agreement ou Contrato Habilitante do Projecto, que pode ser um contrato de concessão que dá ao SPV o direito de construir e explorar o projecto, seja através da prestação de um serviço a entidades públicas ou a particulares. É este o contrato público normalmente associado ao Project Finance. Porém, deve ter-se em atenção de que pode não se tratar de um contrato, mas sim de uma licença ou autorização. Pode, ainda, não ser celebrado com pessoa colectiva pública, mas antes uma posição contratual resultante de um contrato com outros privados que garanta a venda de um produto gerado pelo projecto a um preço fixado a longo prazo.

- Contrato de Construção (Engineering, Procurement and Construction Contract), que pode ser do tipo "chave na mão", isto é, um contrato de tipo "chave na mão" para a construção do projecto por um preço fixo, para estar construído numa data fixada.

- Contrato de Fornecimento (Input Supply Contract), é um contrato que permite o fornecimento de combustível ou de outro produto permanentemente necessário ao desenvolvimento do projecto a longo prazo, de acordo com a fórmula previamente convencionada.

- Contrato de Gestão (Operating and Maintenance Contract), incumbe um terceiro da execução do projecto depois de construído.

- Contrato de Apoio Público ou Contratos de Atribuição (Government Support Agreement), estabelece apoios, garantias ou benefícios fiscais dados ao projecto e ao investimento, pelo Estado. 

- Contratos de Financiamento, com financiadores.




VANTAGENS E DESVANTAGENS

As vantagens decorrem do sistema acima apontado. Os promotores/sponsors podem, sem risco, desenvolver projectos para os quais não tenham fundos ou, aos quais, não queiram alocá-los. Além disso, podem dispensar todas as estruturas técnicas, uma vez que a SPV encarregar-se-á, em conjunto com os financiadores, de contratar a competente expertise, estudando os riscos. No fundo, devemos ter presente que a montagem do esquema vai ser realizada pelos financiadores, os quais surgem, deste modo, como prestadores de serviços. A possibilidade de sindicar os financiamentos (sindicatos bancários) ou de recorrer ao mercado de capitais, por diversas vias, para o fazer, permite congregar cifras significativas.
Os projectos mais ambiciosos são viabilizados. Há, ainda, espaço para se fazer uma distribuição equitativa dos riscos.
Quanto as desvantagens, os especialistas apontam os custos de transacção elevados. A montagem da operação exige estudos complexos, que devem ser pagos. Os financiamentos, assentes em créditos futuros, têm custos superiores aos das operações comuns. Por isso, compreende-se que o Project Finance só seja de encarar para empreendimentos de grande vulto.
Este tipo contratual financeiro opera no longo prazo. Não há possibilidades realistas de fazer previsões nesse plano. Um pequeno desvio inicial no cálculo do crescimento futuro pode, a título de exemplo, desequilibrar totalmente o negócio.
Quer isso dizer que, mau grado a lógica da engenharia financeira subjacente, o mercado só sossega se lhe for dada a garantia do Estado, directa ou indirectamente. Um projecto que corra mal pode custar uma fortuna aos contribuintes.



CONCLUSÃO

O Project Finance é um contrato complexo, de escopo financeiro, com um claro elemento de organização e que pode funcionar em coligação com numerosos outros contratos. Pela sua complexidade, a sua conclusão deve ser acompanhada por juristas experientes, apoiados em equipas técnicas que, no terreno, conheçam perfeitamente a obra em vista, as condicionantes sociais e políticas e a evolução previsível do sector. Convém, ainda, diluir o risco, através da dispersão de responsabilidades e de um criterioso apoio público.
Isso pressupõe que os financiadores se dotem de estruturas técnicas adequadas ou contratem consultores da sua confiança, que colaborem no projecto e fiscalizem o seu desenvolvimento.




Elaborado por: Dr. Elvis Barros




BIBLIOGRAFIA:

CORDEIRO, António Menezes - Direito Bancário, Coimbra, Almedina, 5ª ed., 2015.

CORREIA, Luís Carlos Cardoso- Project Finance: Caracterização numa Análise Juscomparada, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2014.

CONTRATOS Públicos e Project Finance, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2004.

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